domingo, 21 de fevereiro de 2010

O JUIZ E O JOGO POLÍTICO

Publicado no jornal “A Gazeta” de domingo, 21/02/10

grego Pensando nas eleições deste ano no Brasil, e especialmente no Amapá, resolvi falar um pouco da cultura grega clássica, dos homens e mulheres que viveram entre os séculos V e VI a.C. na cidade grega de Atenas, chamada por Platão de Sophia. Essa palavra grega significa um tipo especial de sabedoria que une a teoria à prática, pois eles eram pessoas que filosofavam e praticavam o que pensavam, de acordo com a jornalista Ana Beatriz Magno.

Os gregos encenavam tragédias, discursavam sobre a educação e tinham escolas para onde mandavam os meninos e praticavam a democracia com convicção. Magno informa que a cada doze meses sorteavam um quinto dos 40 mil cidadãos de Atenas para ocupar os principais cargos públicos. O sorteio acontecia na Ágora, um misto de praça, mercado e assembleia. Os mandatos eram renovados anualmente e ninguém podia permanecer no mesmo cargo. Segundo a autora, se você era juiz num momento, no outro podia ser soldado. As decisões importantes eram tomadas em grandes assembleias, realizadas mensalmente com a participação de todos os cidadãos. Todos em termos, diz a autora, pois a mesma Grécia clássica e heroica excluía mulheres e escravizava estrangeiros. Só os machos, adultos e livres podiam ser considerados cidadãos. Mas, apesar dos preconceitos, não se pode apagar o valor de um dos períodos mais férteis da humanidade. Eles também inventaram todo um cotidiano de práticas e prazeres, tais como as padarias, teatros, termas e os jogos olímpicos, estes sempre em homenagem a Zeus, em Atenas. E nunca em tempos de guerra. Os atletas competiam nus e qualquer pessoa podia assistir - menos as mulheres casadas. As desobedientes pagavam com a vida, jogadas do alto de uma rocha. Conta-se que só uma mulher rebelde, chamada Calipatira, foi perdoada, pois corajosamente invadiu a arena para abraçar o filho vitorioso.

Por ser o clima muito seco e quente no verão e frio e úmido no inverno, Aristóteles, que foi discípulo de Platão e mestre de Alexandre, o Grande, sugere em um dos seus mais eruditos textos, “Os Meteorológicos”, que a ascensão e a queda de grupos políticos e militares da Grécia eram determinadas pelas mudanças do clima.

Mas embora saibamos que o determinismo geográfico é uma teoria etnocêntrica, sentimos no ar um clima variante e sempre cheio de factóides e verdades na Sophia amapaense. O mercúrio fica dilatando e retraindo em todos os termômetros políticos; partidos e candidatos dançam a valsa dessa oscilação; o povo anda ofegante, na expectativa das decisões.

gov waldezÉ que vão começar as olimpíadas da política amapaense. Porém, quem apitará o primeiro jogo é o governador. Ele é o dono do apito e do cronômetro. Tudo depende de sua decisão, mas ainda não levantou o braço, apenas adverte os jogadores, dizendo que eles poderão ser penalizados se transgredirem as regras. A tensão é muito grande. Até as torcidas, na Ágora, reclamam, ainda que curiosamente não ofendam o árbitro. Os nossos atletas também estão nus, por enquanto despidos de suas vaidades. São gregos, troianos e bárbaros, ávidos para iniciar seus esforços. Mas não dá. O árbitro não apita, apenas olha o cronômetro.

Mulheres, velhos e adolescentes levantam-se em “ola” na torcida. Parecem mais aborrecidos quando o locutor anuncia que haverá um “minuto de silêncio”. Então protestam. Ora, todos são cidadãos, não mais como na democracia grega.

Finalmente parece que vai começar. Mas um relâmpago anuncia a trovoada, que vem seguida de um toró amazônico sem igual. O clima fica meio frio, a água alagou o campo. Todos vão embora junto com a luz, pois o sistema elétrico do local ficou danificado.

No campo, entre a iluminação dos relâmpagos e raios, ficam os jogadores e o juiz, congelados, até o recomeço do jogo no dia seguinte. Mas só o juiz sabe que depois do jogo não poderá mais permanecer no mesmo cargo. Será um soldado ou um general nessa partida da cidadania.

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