sexta-feira, 31 de agosto de 2012

SIGNO DO SOL (*)

Poema de Luiz Jorge Ferreira
Após arrumar o Fado, as Photos, e a Música de Chico Buarque,
Na estante ao lado.
Mamãe deita para morrer.
Eu fui buscar o mar, puxando-o pela janela apodrecida da sala.
E o coloquei ao seu lado. O cheiro de peixe pregou-se em nós.

Depois de cirandar entre Ursa Maior e Plutão.
Quero dizer Av Ernestino Borges e Odilardo Silva.
Mamãe finge que um dia afogou os igarapés na poça d’água do quintal.
Onde o cheiro dos cajus embriaga o sol. E lá criou os particípios passados para que ninguém a visse soletrar S.a.u.d.a.d.e.
Havia um barulho de flores no cio.E o mês de Abril partindo a galope.

Hoje durmo nu sob o Equador
Corro anão sob o céu de Macapá.
Onde ruminar com os potros, sorri minh’alma.

Quero juntar-me aos tuiras e tuins. Um mar tolo foge pelo ontem.
Ao longe a chuva chicoteia nos telhados.
Em mim o que chicoteia eu engulo, com saliva e afim.
À noite, a noite molha minha pele negra com coisas da noite, sob a luz vesga da lua.
Ela uma tola que se acocora com Cora Coralina.
E se intimida com o Português de Pessoa.
Sabe que o mar é um punhado de água com sal.
E conta para as gaivotas que contam para minha mãe que grita.
 -A bombordo com o sol.

Amargo até o ultimo mel dou nó nos nós.
Corro para o por do sol cego como um pássaro cego em um vôo cego.
Minha mãe salga o olhar no mar simplesmente só.
Os olhos dos gatos que sobem sobre os escuros, a espiam.
Enquanto cansada, cheira o mar que eu trouxe, ainda sujo de areia.
Ela conversa com sereias, e outros, outros.
Eu sou para ela a canoa talhada em ossos que ela fala que deixou na orla das horas, lá atrás.
Fadigado por outros tantos anos tantos.
Ouço pisadas, espaçadas, do tempo, na areia de outrora.
São 18:45 e chove.
Como se fosse a única coisa tão próxima.

Réquiem... 2012, Osasco, tanto de tanto de 2008.
Sétimo Dia.
O rastro que o mar deixou espalhado atraiu as estrelas translúcidas.
E os cães abandonados.
Eu fechei as mãos com força e o sangue voltou ao coração como se de lá nunca houvesse saído.
  
(*) Publicado no Informativo da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, de São Paulo, em 28.08.2012.


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