quarta-feira, 17 de outubro de 2012

DOIS POEMAS DE PAULO TARSO BARROS


DIMENSÃO PRIMÁRIA DO SER

Antes que as palavras de poeta
se percam como as nuvens itinerantes,
quero que o poema transforme-se numa casa
(não precisa que seja uma mansão
ou uma construção portentosa).
Que o poema seja uma casa
-      com um quarto apenas, onde caiba
um coração universal e as emoções
viáveis de uma existência.

Se eu chamasse por mim nas planícies,
a minha voz não seria ouvida,
pois eu não estaria lá.
Eu só estarei onde houver espíritos
porque eu sou a vida.
Por isso me expresso,
às vezes sem jeito,
às vezes com exagero.
A febre de viver,
os delírios de andar neste mundo-betoneira,
tudo isso já experimentei.
Já experimentei ser neutro, ser zero,
ser equilibrado, mas foi inútil.

Nasci assim.
Mas eu só nasci aos treze anos cronológicos
e de lá para cá tenho andado meio sem norte
(embora embrenhado no Norte geográfico),
tenho perambulado levando nas almas
as pleonásticas solidões dos poetas;
tenho dormido na insensatez do ócio,
esse ócio infame, estéril e
extorquidor de emoções, que chega até mesmo
a boicotar nossa luminosidade.

Arrependido?
Não.
Apenas encabulado, constrangido,
patético e verminal:
na dimensão primária do ser.


INVENTÁRIO DAS BUSCAS


Nesta manhã deixo a vida cair como a chuva
nos poliedros dos olhos e nos invisíveis
espelhos cromáticos dos meus espíritos.
Em mim, que sinto e tento explicar, digladiam-se
os liquefeitos sonhos de anos e anos,
de esperas e esperas, com anjos e demônios
que despencam do horizonte como perfuratrizes
assassinas sobre a minha sorte.

Nas desfeitas ondas, irmanadas aos abismos
para onde fomos exilados
(como se fôssemos paranóicos),
a síndrome imensurável da Terra
é compactada na minha percepção de poeta.
E a minha visão, que decola de sua órbita natural,
busca os infinitos do criador.
E deixo a vida viabilizar-se,
amar seus amores,
escrever seus poemas e buscar-se, sempre.

Como um animal eu volto ao meu lar
e contemplo vossos telhados, Macapá;
contemplo a absurda calmaria das praças
moldadas na linear paisagem urbana.
Volto a casa como um poeta do século XX,
com meu livro de incontáveis páginas em branco,
minha dor de cabeça proletária e civil.
Os bares já estão vazios e tudo é muito ambivalente
e tudo vai explodir na bela aurora setentrional.
Caminho por Macapá e tenho cinco bilhões
de irmãos espalhados neste planeta solitário.

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